A combinação de arroz e feijão pode ficar escassa no futuro. Fonte: Thinkstock
Se
hoje você adora a mistura bem brasileira de arroz e feijão no almoço,
chocolate de sobremesa, um cafezinho para espantar o sono no meio da
tarde e mandioca frita no happy hour, saiba que seus hábitos alimentares
podem estar ameaçados. Isso porque é possível que as mudanças
climáticas do planeta sejam fatais para o cultivo desses alimentos.
Não é de hoje que os cientistas alertam que, até 2050, a Terra deve ficar até 3 °C mais quente. O
Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC) foi além e já divulgou um estudo que prevê que, nos próximos 100 anos, esse aumento pode chegar a quase 6 °C.
Se
nada for feito para desacelerar esse quadro e reverter os padrões, a
tendência é que os efeitos do aquecimento global sejam sentidos em médio
prazo. E, nesse contexto, até nossos hábitos alimentares serão
alterados.
Segundo o engenheiro agrônomo e professor da PUCPR
Carlos Augusto Parchen,
ainda não há certeza em relação ao cenário mundial. Isso porque, apesar
dos indícios de que é a ação humana que está causando o aumento da
temperatura, ainda não está comprovado que a causa e o efeito das
mudanças climáticas realmente são esses.
Alguns estudos, conforme
explica o professor, sinalizam para o fato de que, nem se todas as
cláusulas do Protocolo de Kyoto fossem seguidas, o aumento de 3 °C na
temperatura global poderia ser evitado. E se o clima ficar mais quente, é
certo que o cultivo de alimentos vai se transformar.
Parchen
explica que o próprio aumento da temperatura já acarreta mudanças, pois
algumas plantas só se desenvolvem no frio. Em contrapartida, há também a
influência das chuvas, pois em algumas regiões haverá mais incidência
delas enquanto outras vão sofrer com a falta. Nesse contexto, algumas
plantas podem precisar migrar para sobreviver. Outro fator que o
professor cita é a ocorrência de irregularidades nas estações do ano
(que não serão mais tão definidas) e na época de chuvas, o que algumas
espécies não conseguem suportar.
Plantações de arroz no Vietnã. Fonte: Thinkstock
Uma
das ressalvas do engenheiro agrônomo é em relação ao cultivo de grãos
vindos de gramíneas, como o arroz, o milho e a soja, que não se adequam
nem a pequenas variações de temperatura. A preocupação é que talvez não
haja sequer área suficiente para plantar esses alimentos e atender a
demanda de consumo da população.
O professor explica que, no
Brasil, o aumento de 3 °C representa uma diminuição de 20% a 30% das
áreas produtivas. Porém, se a elevação da temperatura chegar a 5°C, o
número de terrenos disponíveis para plantio cairá pela metade.
Além
disso, pesquisas nacionais mostram que as produções de mandioca e café
já apresentam queda. Em outros países, os especialistas alertam para os
problemas no cultivo do cacau, dos vinhedos de Bourdeaux (França) e para
a ameaça na produção salmão, do atum e do bacalhau.
Outro
exemplo de espécies ameaçadas citadas por Parchen são as frutas com
caroço, como a manga e o pêssego, que dependem do clima frio para se
desenvolver. Assim, para aproveitar bem esses alimentos enquanto eles
ainda estão abundantes em restaurantes e supermercados, confira abaixo
quais estão com o futuro comprometido abaixo e como aproveitá-los em
receitas.
1# Arroz
Fonte: Thinkstock
Não
é apenas no prato do brasileiro que o arroz faz sucesso. Em países como
Japão e China, o alimento é a base das refeições. Porém, talvez seja
preciso rever esse hábito no futuro.
O alerta não é de hoje: uma
pesquisa
publicada em 2010 no periódico Proceedings of the National Academy of
Sciences (PNAS) revelou que, nos últimos 25 anos, os campos de cultivo
de arroz diminuíram sua produtividade em até 20% em algumas localidades.
Segundo
informações da BBC, os pesquisadores avaliaram o plantio de arroz em
227 fazendas de seis países que mais produzem o alimento, como
Tailândia, Vietnã, Índia e China. A conclusão foi que, com o aumento da
temperatura noturna, as plantas precisam gastar mais energia para
respirar, o que afeta a fotossíntese e as enfraquece.
O estudo
comprovou o resultado de trabalhos anteriores. Em 2004, pesquisadores já
alertavam que, nos campos de arroz das Filipinas, para cada grau a mais
na temperatura noturna, o prejuízo na produção pode ser de até 10%.
No
Brasil, as safras de arroz também vêm sendo comprometidas. Em junho de
2011, a Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa
Catarina fez um alerta sobre a produção de arroz em Garuva. Em
entrevista à
Agência Brasil,
a engenheira Dione Nery Benevenutti revelou que as altas temperaturas
na região, que chegaram a 40 °C, causaram uma queda de cerca de 20% na
produtividade.
Se nada for feito, a tendência é que o arroz se
torne um alimento escasso no mercado. Assim, vale aproveitar o prato
feito de todo dia e as várias opções de sushi enquanto ele ainda é
abundante.
Além do arroz, o engenheiro agrônomo Carlos Parchen
cita o problema dos grãos em geral, que são muito sensíveis ao aumento
da temperatura. Segundo ele, se a produção for alterada, a escassez
tende a afetar toda a cadeia alimentar. Isso porque alguns animais que
se alimentam de milho, por exemplo, também sofreriam com a diminuição da
capacidade produtiva, afetando, consequentemente, o consumo de proteína
da população.
Assim, para aproveitar ao máximo o alimento enquanto ele ainda é acessível a todos, a dica é a receita de
Arroz à Grega.
2# Feijão
Fonte: Thinkstock
O
alerta feito em relação à produção de arroz no Brasil também pode ser
aplicado ao cultivo do feijão. Na metade de 2011, a Cooperativa
Agropecuária Mista Regional de Irecê, na Bahia, apresentou dados sobre a
produção do alimento que servem de alerta. Conforme divulgou a
Agência Brasil, se antes o município produzia 3 milhões de sacas do alimento, hoje os produtores colhem abaixo de 10% desse valor.
Segundo
a entidade, os fatores climáticos são os que mais influenciam nessa
queda, já que a má distribuição das chuvas compromete o cultivo. Vale
ressaltar que o município já foi conhecido como “Cidade do Feijão” nas
décadas de 1980 e 1990, mas atualmente mais de 6 mil agricultores da
região estão em dívida com bancos devido aos prejuízos da safra.
Não é à toa que o preço do produto está subindo cada vez mais. Por isso, garanta já o seu estoque e aproveite uma deliciosa
Sopa de Feijão sem culpa.
3# Chocolate
Fonte: Thinkstock
Para
as mulheres que não vivem sem chocolate, fica o alerta: o doce oficial
da TPM pode estar com os dias contados. Uma pesquisa de dezembro de 2011
realizada pela Bill & Melinda Gates Foundation revelou que, em
virtude do aquecimento global, o produto que tem origem no cacau pode se
tornar artigo de luxo na despensa.
A conclusão surgiu após a
análise das plantações da Costa do Marfim e de Gana, de onde sai a maior
parte da matéria-prima para a produção de chocolate no mundo. Como a
espécie precisa de um clima fresco para se desenvolver, o aumento da
temperatura nessas regiões até 2050 pode diminuir drasticamente a oferta
de cacau.
Assim, se hoje já é complicado atender à demanda
mundial pelo chocolate (o que tem feito os preços do alimento
aumentarem), essa situação pode se agravar ainda mais no futuro, dando a
ele status de artigo de luxo, como informou o jornal britânico
Telegraph.
Para
reverter o caso, os fazendeiros estão buscando novas regiões que sejam
mais frias, porém o problema do aumento do custo continua. Isso porque
nesses locais será preciso fazer um alto investimento em tecnologias de
produção. Logo, se você é fã do doce, é melhor aproveitá-lo ao máximo
por enquanto, em receitas como a de
Nega Maluca.
Vale
ressaltar, em contrapartida, que nem tudo está perdido. Segundo o
professor Carlos, há projetos nacionais e internacionais com foco na
adaptação de espécies, sendo que a ciência tem meios de desenvolver
plantas mais resistentes. Um exemplo seria o da maçã, que há alguns anos
dependia de climas frios para sobreviver e hoje já possui variações
capazes de crescer até no cerrado. A solução também é válida para o
cacau, que pode ganhar espécies que suportam o calor com mais
facilidade.
4# Café
Fonte: Thinkstock
O
café que ajuda a espantar o sono no trabalho e que dá o toque final às
refeições também pode estar sob ameaça. E esse alerta não é recente: em
2007, pesquisadores da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
(Embrapa) ressaltaram que, se nenhuma ação fosse tomada em relação ao
aquecimento global, até o ano de 2100 a produção brasileira dos grãos
poderia cair até 92%.
De acordo com os dados divulgados pela
Agência Brasil,
as plantações de café, soja e feijão são as que mais sofrem com a
elevação da temperatura. Assim, a estimativa é que os cafezais deixem de
produzir 30 milhões de sacas para oferecer apenas 2,4 milhões se o
quadro climático não for revertido.
A boa notícia é que, desde que
o estudo foi publicado, os pesquisadores vêm trabalhando em soluções
para evitar a queda drástica na produção. Para tanto, há apostas em uso
de novos fertilizantes e no desenvolvimento de espécies resistentes ao
calor. Para o pesquisador da Embrapa que participou do estudo na época,
Eduardo Assad, não há a possibilidade de que o café desapareça.
Ainda assim, vale a pena aproveitar bem o café em uma receita de
torta, por exemplo.
5# Salmão
Fonte: Thinkstock
Quem gosta de apreciar sushis,
ceviches
ou mesmo a versão grelhada do salmão talvez precise procurar outras
variedades de peixes para se alimentar no futuro. Uma pesquisa recente
da
National Wild Federation mapeou uma série de fatores que irão prejudicar a espécie no futuro.
Entre
eles estão a diminuição do gelo nas superfícies, rios com águas mais
quentes e com margens mais assoreadas devido ao aumento da ocorrência de
incêndios (o que torna a espécie mais suscetível a predadores),
tempestades e inundações mais graves. Além disso, o aumento da acidez e
da temperatura das águas dos oceanos e a elevação do nível do mar também
tendem a prejudicar os salmões.
O professor Carlos ressalta que o
problema começa já na cadeia alimentar. Os plânctons, que são a fonte
de alimento para os peixes, crescem apenas em água fria. Assim, com o
aumento da temperatura dos oceanos, toda a alimentação da vida aquática
fica comprometida.
Além disso, a maioria dos cardumes é
migratória, ou seja: na água fria, as espécies crescem, enquanto nas
águas mais quentes acontece a reprodução. Todo esse contexto será
afetado se os oceanos e rios ficarem mais quentes.
Para evitar a
extinção dos peixes, a única solução é reverter o aumento constante da
temperatura global. Assim, aproveite o alimento agora, experimentando
pratos como o
salmão ao champignon.
6# Bacalhau e atum
Fonte: Thinkstock
Não
é apenas o salmão que corre o risco de acabar se nada for feito em
relação às mudanças climáticas. Outras espécies, como atum e o bacalhau,
também não vão sair ilesas. Em 2006, um levantamento da Universidade de
Stanford (Estados Unidos) alertou que em 2050 o cenário da vida marinha
não será nada bom e, até lá, provavelmente todos os pratos com frutos
do mar que consumimos hoje estarão comprometidos.
Naquela época,
os especialistas já notavam uma queda na captura mundial dos peixes,
sendo que alguns em especial haviam perdido 90% de sua população total.
Esse é o caso do atum e do bacalhau, por exemplo, que ainda enfrentam
problemas com a pesca predatória, correndo sérios riscos de extinção. O
engenheiro agrônomo cita também a sardinha, que não terá meios de
crescer e se reproduzir com o aumento da temperatura da água.
Em entrevista à
BBC,
o pesquisador Steve Palumbi afirmou que, se a maneira de explorar as
espécies oceânicas não mudar, esse será o último século que teremos
acesso a frutos do mar para consumir. Por isso, não adie mais aquele
jantar em um restaurante especializado nesse tipo de comida ou
experimente cozinhar
bolinhos de bacalhau.
7# Mel
Fonte: Thinkstock
O mel também não está garantido no cardápio do futuro. Uma pesquisa do
Departamento de Agricultura dos Estados Unidos divulgada em 2010 apontou que as populações de abelhas diminuíram de 5,5 milhões para 2,5 milhões em apenas 50 anos.
A
causa do problema, nesse caso, não está ligada diretamente às mudanças
climáticas, mas sim aos parasitas e às doenças causadas por
micro-organismos. No entanto, boa parte dos especialistas acredita que o
aquecimento do planeta também faz a diferença nesse processo.
Para aproveitar o doce enquanto ele é abundante, a dica é a receita de
pão de mel.
8# Mandioca
Fonte: Thinkstock
A brasileiríssima mandioca também corre o risco de ficar extinta nas plantações – e fora das nossas refeições. Em 2005, o
periódico
da Universidade de Brasília (UNB) publicou um alerta do biólogo Nagib
Nassar que afirmava que algumas espécies da planta estavam agonizando.
Na época, ele já notava queda na produtividade brasileira e o sumiço de
algumas variações selvagens do cerrado brasileiro.
Recentemente, a
Embrapa confirmou as expectativas negativas do pesquisador, que
desenvolveu juntos com a empresa um levantamento com base nas
estimativas do IPCC para o aumento da temperatura.
De acordo com o
estudo,
o aquecimento global trará prejuízos para o setor agrícola brasileiro
já em 2020, alterando inclusive a geografia de produção do país. Nesse
contexto, a mandioca deverá se extinguir das regiões em que está hoje
para ser plantada no Sul, onde a temperatura atingirá valores
suficientes para se tornar apropriada para o plantio do alimento.
Vale
ressaltar que essa migração pode salvar a mandioca. O professor Carlos
explica que essa é uma tendência para o futuro: as espécies vão migrar
para áreas mais adequadas, que proporcionem as condições adequadas para o
seu desenvolvimento. Nesse contexto, a área brasileira com maior
capacidade de produção deverá ser a região amazônica, já que o Sul
poderá sofrer com enchentes e secas, enquanto o Nordeste sofrerá com a
falta de água.
Assim, para comemorar que a mandioca ainda está disponível em todo país, que tal um
escondidinho de carne seca?
9# Pinhão
Fonte: Reprodução/ Wikimedia
Em 2011, a associação internacional Slow Food terminou a compilação de uma lista batizada de “Arca do Gosto”, formada por
1.000 alimentos de todas as partes do globo que correm o risco de desaparecer. Entre eles,
20 são brasileiros e deixam em alerta os moradores da região Sul.
Isso porque o pinhão
está em risco
não diretamente por causa das mudanças climáticas, mas pela coleta não
sustentável. Além disso, o corte irresponsável da floresta de Araucárias
está tornando a semente um artigo de luxo para o cardápio do futuro.
Para desfrutar do pinhão enquanto isso, a dica é a receita de
bolo com o ingrediente.
10# Palmito-juçara
Fonte: Thinkstock
Na mesma compilação da Slow Food aparece o
palmito-juçara,
variação encontrada principalmente na região sudeste do país. Anos
atrás, ela já esteve ameaçada pela coleta não sustentável, assim como o
pinhão, mas foi salva pelo palmito pupunha, que possui um cultivo mais
simples.
Porém, o alimento ainda está ameaçado pela extração
irresponsável. Reservas indígenas guaranis é que têm garantido que a
espécie sobreviva, graças ao plantio e à coleta engajados, que são
estimulados por um projeto específico batizado de “Fortalezas”.
Quem quiser aproveitar o palmito sem culpa, experimente a receita de
trançado, feita com o ingrediente.
11# Uísque
Fonte: Thinkstock
Em
2008, surgiu um alerta dos pesquisadores do Imperial College London que
preocupou os apreciadores de um bom uísque escocês. Segundo informações
divulgadas pelo periódico
Press and Journal, dentro dos próximos 70 anos o país pode ser forçado a abrir mão do uísque como bebida nacional para apostar nos vinhos.
Isso
porque o aumento da temperatura vai tornar a região perfeita para o
cultivo de vinhedos, enquanto tornaria o uísque impossível de ser
produzido.
Assim, quem quiser apreciar a bebida sem se preocupar com o futuro deve garantir suas garrafas desde já.
12# Vinhos de Bordeaux
Fonte: Thinkstock
Os
apreciadores de um bom vinho também podem ficar com os rótulos
sofisticados da região de Bordeaux, na França, apenas na memória. Em
março de 2011, foi divulgado um estudo que alerta que o constante
aumento da temperatura no planeta ameaça os vinhedos da região, sendo
que em 2050 o local se tornará totalmente inadequado para a cultura de
uvas.
Nesse contexto, o Cabernet e o Merlot são os mais ameaçados, segundo informações do jornal
Telegraph.
Isso porque o clima mais quente faz com que a planta amadureça mais
cedo, enquanto as secas de verão tendem a prejudicar o crescimento da
videira. Por isso, é bom abastecer o seu acervo e degustar a bebida
antes que ela acabe.
TodaEla